Artigos – Ano 2017: Sucena Shkrada Resk – Blog Cidadãos do Mundo

Uma brasileira chamada Nise da Silveira…uma rebelde a favor da humanização
26/12/2017 11:45
Por Sucena Shkrada Resk
“…Nunca me fizeram a pergunta que eu queria ouvir em minha vida: onde estão os homens e mulheres que pintaram estas obras artísticas…? Este teor de questionamento quanto ao interesse da imprensa feito pela psiquiatra alagoana Nise da Silveira (1905-1999), em documentário sobre sua trajetória na defesa da humanização no tratamento psiquiátrico no Brasil é de uma profundidade, que talvez resuma o valor de sua contribuição que se prolonga postumamente.
Já aposentada dizia – “…Enquanto eu viver, intervirei… Sou uma cidadã do mundo, quando eu vir um elefante sofrendo, se eu puder ajudar eu ajudo…O menino em Biafra, tudo isso me angustia…”. Essa era a característica desta “rebelde” a favor da humanização. E encontrava no pensamento de Antonin Artaud, um pouco das respostas ao que acreditava: “…Há 10 mil modos de ocupar-se da vida e de pertencer à sua época…”. Abolia os modelos cartesianos e preferia reler por várias vezes, Machado de Assis, literatura na qual encontrava prazer em conhecer a fundo suas personagens. E encontrava num pequeno gesto de “melhora” de seus pacientes, como um beijo no rosto (de quem antes só ficava com o semblante fechado), algo que lhe trazia um grande bem-estar.
A arte e o afeto animal
A expressão pela arte e o afeto animal foram suas ferramentas ao longo de décadas, que resultaram primeiramente na criação da seção terapêutica ocupacional do Centro Psiquiátrico Pedro II, em Engenho de Dentro, no Rio de Janeiro, em 1946, em colaboração ao colega Fábio Sodré. A partir de 1952, ela constituiu o Museu Imagens do Inconsciente, que conta atualmente com um acervo de 350 mil obras e consequentemente manifestações de histórias de vida.
Incansável, no ano de 1956, inaugurou a primeira clínica psiquiátrica no Brasil em regime de externato – a Casa das Palmeiras. A psiquiatra começou sua atuação com princípios freudianos e depois seguiu com os Junguianos no país e organizou o primeiro grupo de estudos sobre o psiquiatra. Seguiu as orientações dele sobre estudar os arquétipos, a mitologia para compreender as mensagens nas mandalas, quando o encontrou pessoalmente no exterior. Desde o início até a velhice, Nise combateu o modelo manicomial, que se pautava em eletrochoques, lobotomia e confinamentos e excessos de medicamentos, que chamava de “camisas de forças químicas”. Não tinha “papas” na língua e criticava uma política que privilegiava multinacionais em detrimento dos seres humanos e modelos fechados, que consideram mais cômodo fazer os pacientes dormirem.
Seu aspecto franzino escondia uma fortaleza e rebeldia instigantes, que a fez superar vários obstáculos ao longo de sua trajetória. Como dizia, não conseguia trabalhar sem unir o científico e o filosófico, nas linhas de substratos de suas pesquisas.
Mais um pouco desta figura humana e singular se revela, entre 15 e 19 de abril de 1986, quando o jornalista Leon Hirszman entrevista Nise da Silveira, que aposentada, ainda continuava atuante e com uma memória e narrativas cativantes. Posteriormente, esse registro se transformou no documentário Nise da Silveira: Posfácio: Imagens do Inconsciente. Contundente, ela diz em dado momento: “…Eu não sou uma senhora filantrópica de jeito nenhum. Eu sou uma pessoa curiosa do abismo, embora tenha consciência de que o abismo é tão profundo que eu apenas passo nas bordas…”.
A psiquiatra revela o que sempre foi primordial para ela: “… (é preciso) aceitar a dignidade do trabalho seja ele qual for…O trabalho não é uma coisa servil, é algo que exprime a alma da pessoa…”. Assim ela encarava a sua atuação por décadas e observava o ofício desenvolvido por diversas pessoas, com paciência e respeito. E traz nessa afirmação também o que considerava como um aspecto favorável na terapia ocupacional (não, aos velhos moldes, como frisava), no tratamento dos doentes. “Considero as atividades como um meio de expressão da problemática interna dos doentes…e que estas, de alguma maneira, podem agir sobre esta problemática, compensando, desviando, segundo os casos”.
Chegou a ser presa por dois anos, durante a Ditadura Vargas, como comunista (por sua identificação com o Marxismo), quando conheceu Olga Benário e Graciliano Ramos, que cita esta passagem em “Memórias de Um Cárcere”. Ficou afastada do serviço público, entre 1936 e 1944. Sua biografia é contada no livro “Nise da Silveira: caminhos de uma psiquiatra rebelde, de Luiz Carlos Mello”. Na telona, o longa-metragem Nise – O Coração da Loucura, dirigido por Roberto Berliner e estrelado por Gloria Pires, em 2016, também possibilita conhecer um pouco mais sobre esta personagem que transcendeu seu tempo.
A sua contribuição transpôs fronteiras geográficas… e o seu arquivo pessoal integra desde 2014, o Programa Memória do Mundo, da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO).
Casada com o respeitado sanitarista Mario Magalhães, formava com ele uma dupla que transpirava em suas ações a palavra humanização. Ao longo de sua vida, escreveu mais de 10 livros, desde sua tese de Doutoramento “Ensaio sobre a criminalidade da mulher no Brasil” (1926) a “Gatos, a emoção de lidar” (1998), pela Léo Christiano Editorial, um ano antes de sua morte. Nesta bibliografia, a autora escreveu títulos sobre Jung e as Memória do Inconsciente, que dizem muito sobre o que acreditava.
Falar de Nise da Silveira é algo para muitos capítulos e não é por acaso que é considerada uma das mulheres mais importantes do século XX, pela essência e profundidade de sua contribuição. Certamente eu teria muito orgulho em entrevistá-la como jornalista.

  • Crédito das fotos: Sucena Shkrada Resk – tiradas na Exposição Ocupação Nise da Silveira, no Itaú Cultural, em dezembro de 2017 – acervo cedido pelo Museu Imagens do Inconsciente
    Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk

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Ilhas do Pacífico: as lições das crianças das nações insulares na COP 23 – Bula!

18/12/2017 12:27
Por Sucena Shkrada Resk
A Aliança dos Pequenos Estados Insulares (em inglês, Alliance of Small Island States – AOSIS, com 39 países) assumiu, pela primeira vez, um protagonismo na condução da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (COP 23), em Bonn, Alemanha, ao ter na presidência o governo de Fiji, que trouxe uma carga de humanização importante no histórico das conferências. O primeiro-ministro Frank Bainimarama levou para a mesa de negociações a metodologia do “espírito Bula” de fidelidade de inclusão, simpatia e solidariedade, que exprime o conceito pacífico de talanoa. O retrocesso do governo norte-americano na pauta não tirou o brilho dessa iniciativa, que continuará com o Diálogo Talanoa, programado para 2018.
Ouvir os jovens Timoci Naulusala, 12 anos, da província de Tailevu, e Shalvi Shakshi, 10, de Tuatua, Labasa promoveu a sensibilização dos interlocutores da conferência sobre a realidade vivida por quem sofre com as mudanças climáticas na pele. A carga de inocência dessas crianças e o sentimento latente, principalmente ao tocar em “feridas ainda abertas” das privações aos acessos à água, alimentos, decorrentes dos eventos extremos, traz a veracidade necessária para se fugir do ciclo vicioso dos discursos tecnocratas. Entre os países do grupo, Ilhas Salomão, Papua Nova Guiné, Vanuatu e Tonga são os que mais sofrem com eventos extremos.
A COP23 ocorria e os furacões Irma e Maria também já haviam deixado um rastro de destruição em países da AOSIS, como Antígua e Barbuda, Dominica e Cuba, além de Porto Rico, nação observadora da Aliança. Mortes, desabrigados e R$ 40 bi de estimativa de efeitos da devastação.
Este outro vídeo, no qual o pequeno Timoci narra a vida que leva com sua família, na pequena vila, que sofreu os impactos climáticos, apresenta uma carga emocional e de “urgência” e “resiliência” ao mesmo tempo. Shalvi também mostra seu povoado afetado pelo ciclone Winston, em fevereiro de 2016, e a preocupação com o futuro da comunidade. Essas populações, em sua maioria, são agricultores familiares, que têm suas subsistências oriundas do que cultivam na terra.
Ações pontuais de adaptação
Hoje saber que existem ações em andamento de adaptação espalhadas pelo mundo, com um recorte especial no continente africano, mesmo que ainda muito aquém do necessário, se traduz em uma mensagem de esperança nas entrelinhas das negociações.

Algumas experiências foram destacadas na COP23, em exposição do fundo de adaptação. Mas é necessário explicar que não é possível mensurar a eficácia de todas, tendo em vista, que algumas são polêmicas, no recorte socioambiental.
Entre as dezenas de relatos, há ações interessantes de países insulares, como a campanha Salve Tuvalu para salvar o mundo!, com 10 mil imagens… e o plano internacional de adaptação centrado na criança, que mostra o contexto da região da Ásia-Pacífico, que tem 750 milhões de jovens, entre 15 e 24 anos e mais de um quarto da população menor que 14 anos. A proposta é que cada comunidade e escola projete e implemente a projetos de adaptação que usam financiamento em pequena escala, com a participação dos governos locais.
Integram esta iniciativa 14 países: Bangladesh, Indonésia, Laos, Myanmar, Nepal, Filipinas, Tailândia e Vietnã na Ásia; e Fiji, Kiribati, Papua Nova Guiné, Ilhas Salomão, Tonga e Tuvalu no Pacífico. O projeto é apoiado pelo governo australiano, bem como Fundação COFRA e OAK com público adicional de doadores da Espanha.
O Senegal está sendo pioneiro com a utilização de recursos de acesso direito com o projeto Centro de Acompanhamento Ecológico, que tem forte participação feminina e de jovens. Esta modalidade permite uma maior apropriação para implementação das finanças climáticas.
Num escopo mais global, há a Organização Global de Parceria sobre a Água (GWP), entre outras ações.
O peso dos insulares na COP23 teve mais um capítulo interessante que resultou no Ocean Pathway, que introduziu o componente oceano de forma mais sistemática nas negociações. O aumento do nível do mar já tem seus efeitos sentidos por estes países.
Por outro lado, os efeitos práticos em âmbito global da COP23 ainda estão muito distantes do necessário no tocante à implementação dos acordos, principalmente no que se refere ao apoio dos países mais ricos e poluidores aos processos de adaptação dessas nações que já sofrem a pressão do nível do mar que aumenta ano a ano, além do avanço dos eventos climáticos extremos que têm devastado estes países. Lembrando que ano a ano, os apelos são reiterados.
É difícil acreditar na possibilidade real de o aumento da temperatura média do planeta ficar abaixo de 2 graus até o final do século. Justamente uma semana antes da abertura da Conferência, a Organização Meteorológica Mundial (OMM) divulgou que os níveis de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera aumentaram em uma “velocidade recorde” em 2016.
Muitos dos acordos tecidos na COP 21, de Paris, permanecem fragilizados nestas COPs posteriores, quando se observa os encaminhamentos internos dos países que têm de diminuir e acabar com suas fontes fósseis em suas matrizes, incluindo o Brasil. O que teremos de novo na COP 24, que será em Katowice, na Polônia, em dezembro do ano que vem: uma verdadeira incógnita. Isso, no entanto, não tira a importância dos insulares neste ano de 2017.
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*Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk

Amazônia são instrumentos de luta pelos direitos
11/12/2017 09:04
Entrevistada da semana – Angela Amankawa Kaxuyana

Por Sucena Shkrada Resk

O protagonismo indígena na defesa dos seus direitos é a pauta desta semana. Na seara do contexto amazônico, a entrevistada é Angela Amankawa Kaxuyana, da TI Kaxuyana Tunayana, do extremo Norte do Pará, que pertence ao povo Kahyana e Katxuyana. Atual coordenadora tesoureira da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), ela fala ao Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk sobre as principais bandeiras de luta, que envolvem uma leitura pan-amazônica e de instrumentos cada vez mais importantes de protocolos de consulta específicos de cada povo frente a empreendimentos que afetam seus territórios, cultura e modos de vida.

A COIAB foi fundada em 19 de abril de 1989, com sede em Manaus, e é atualmente a maior organização indígena do Brasil, que compõe a base da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) e está vinculada à Coordenação das Organizações Indígenas da Bacia Amazônica (COICA). No Brasil, tem atuação em nove estados na Amazônia Legal (Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins) com o objetivo de articular e mobilizar 60% do total da população indígena do país, com a participação de mais de 200 organizações (desde associações locais a organizações de mulheres e de agentes ambientais e agroflorestais indígenas).

Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk – Hoje quais são as principais bandeiras de luta da COIAB?

Angela Amankawa Kaxuyana – A COIAB tem como missão a defesa dos direitos dos povos e organizações indígenas amazônicos, considerando as suas diversidades, visando sua autonomia por meio de articulação e fortalecimento. São muitos os problemas enfrentados, que vão desde a educação, territórios, impactos ambientais, sustentabilidade, saúde dentre outros e hoje, entre os que têm maior impacto e ameaçam esses povos, estão as construções de grandes empreendimentos na Amazônia.
Trata-se de 46 regiões indígenas de base, com mais de 160 diferentes povos, com um total de 440 mil pessoas, além dos indígenas isolados que evitam o contato com a sociedade nacional e preferem viver de forma autônoma na floresta.
Esses povos ocupam 110 milhões de hectares no território amazônico, distribuídas em 403 Terras Indígenas (TIs) demarcadas (além das que estão em processo de regularização), nas quais as comunidades precisam ter condições de sustentabilidade e sobrevivência digna. Muitos territórios ainda não foram regularizados, exigindo que o movimento indígena se fortaleça para assegurar o direito fundamental aos seus territórios tradicionais.

A COIAB, nos seus 27 anos de luta dentro do movimento indígena amazônico, vem atuando de forma incisiva e clara na defesa e na promoção dos direitos indígenas frente ao cenário político nacional e internacional, apresentando as propostas que estão de acordo com os anseios dos povos indígenas e que cabe aos representantes das instituições governamentais inseri-las dentro do plano político.
Muitos líderes indígenas das diversas organizações que compõem a sua base política apoiam articulações políticas, que buscam diálogo franco e aberto com os órgãos governamentais.
Blog Cidadãos do Mundo – Qual sua avaliação sobre o protagonismo feminino indígena no campo da incidência política nos dias de hoje? Quais são os desafios?
Angela Amankawa Kaxuyana – As mulheres indígenas ainda encontram dificuldades de acesso a espaços decisórios do movimento indígena, uma vez que são ocupados majoritariamente pelos homens. Porém, o protagonismo cada vez mais tem se fortalecido a partir da atuação de mulheres mais jovens e incidência forte e perceptível feminina nos processos de discussão dos direitos.
Hoje a própria COIAB tem na coordenação geral uma mulher – Francinara Soares Baré -, pela primeira vez na história. Ela é de São Gabriel da Cachoeira, AM. Temos a presença feminina na coordenação executiva da APIB, com Sônia Guajajara, do Maranhão, que é um ícone de empoderamento das mulheres. Ela é um é o símbolo de luta dos povos indígenas. Também há mulheres indígenas na política, na região Nordeste…e em outras localidades no país no espaço da política partidária.
Espera-se que as mulheres ocupem e mantenham os espaços formais e informais de liderança, de decisão e poder, além da conquista do respeito e confiança, incluindo as organizações do movimento e de conselhos tradicionais de povos indígenas.

Blog Cidadãos do Mundo – Como a COIAB está atuando no contexto da Pan-amazônia?

Angela Amankawa Kaxuyana – A COIAB tem atuação junto à COICA e faz parte da organização maior na Bacia Amazônica, na qual se discutem as questões junto aos oito países da Bacia Amazônica, além do Brasil (Bolívia, Colômbia, Guiana, Guiana Francesa, Equador, Suriname e Venezuela).

Blog Cidadãos do Mundo – No campo dos direitos indígenas, o que está sendo feito pelas organizações indígenas para fazerem valer as determinações de tratados internacionais, como a Convenção OIT 169?

Angela Amankawa Kaxuyana – Sempre lutamos enquanto povos indígenas para o cumprimento dos nossos direitos assegurados pelas legislações do país e internacional, a luta e as cobranças de forma coletiva é umas das formas mais eficazes para que nossos direitos sejam respeitados. Mas cada vez mais o Estado brasileiro não tem respeitado essas convenções que asseguram esses direitos. O Estado tem praticado aquilo que sempre foi ameaçar e retroceder todo um histórico de luta que afeta nossos direitos, que durante muitas décadas foram conquistados, direitos consuetudinários, direitos que não são adquiridos, mas o que é nosso por direito.

Não temos desistido no que refere ao cumprimento desses direitos. A luta do movimento indígena e a resistência têm sido o fator fundamental para isso. Estamos sempre vigilantes, atentos e prontos para o embate e morrer se preciso for, como muitas das lideranças têm feito e têm perdido suas vidas para proteger a vida do seu povo, e do direito de continuar vivendo.

Blog Cidadãos do Mundo – Fale a respeito dos Protocolos de Consulta Indígena concluídos e em formulação na Amazônia e como está sendo a receptividade no campo jurídico dos direitos?

Angela Amankawa Kaxuyana – Os protocolos próprios de consulta, com base na convenção 169 da OIT, estão sendo elaborados, desenhados com base em cada cultura, forma e tempo de decidir sobre aquilo que afeta o seu povo. Essa ferramenta tem sido cada vez mais importante para ser socializada com a sociedade, principalmente com o governo sobre como, quando e quem pode nos consultar sobre tudo que vai mudar e afetar nossas vidas e as vidas das nossas futuras gerações.

Os protocolos próprios de consultas são nada mais que ferramentas de diálogo e garantia quanto aos nossos direitos de opinar e decidir sobre determinada situação ou tema, para que sejam respeitados e considerados como decisão legítima. Ainda são poucos, mas o ideal é que cada povo tivesse seu protocolo próprio de consulta, porque estamos falando de povos no plural, ou seja, são infinitas formas de olhar e decidir sobre os assuntos. Mas de uma coisa, os povos indígenas não abrem mão em qualquer cultura, tempo e espaço – é o direito ao território e a garantia à terra. Com a terra podemos discutir as várias formas de viver nesse território.

Entre os protocolos pioneiros estão os dos Wayapi, do Amapá, dos Munduruku do Médio e Alto Tapajós do Pará, dos povos indígenas do Alto Xingu, do Mato Grosso, e Yudja, do Baixo Xingu (PA) e de outras regiões que estão em processo de construção e/ou publicação.

(Créditos da fotos – 1 – Mídia Índia e 2 – Sucena Shkrada Resk)

Veja também no Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk:
14/11/2017 – Vozes do direito indígena refletem sobre cenário atual

02/11/2017 – As mudanças climáticas sob o olhar indígena

11/04/2016 – Estão calando aos poucos as raízes indígenas, a memória oral é um caminho necessário

31/07/2015 – Marcelo Munduruku: Quando a natureza e o ser humano traduzem uma única essência

Médica sanitarista fala sobre o universo da saúde ambiental, com destaque sobre os impactos dos agrotóxicos
27/11/2017 14:40

Por Sucena Shkrada Resk
A entrevistada, desta semana, do Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk, é a médica sanitarista Telma de Cassia dos Santos Nery, que trata do tema Saúde Ambiental, com os impactos dos agrotóxicos e da poluição, neste contexto, e também explica o trabalho desenvolvido na plataforma Observatório da Saúde Ambiental, lançada em 2015 (com foco nos comprometimentos do uso de agrotóxicos no estado de São Paulo) e a relevância da difusão dessas informações à sociedade. Telma registra uma longa experiência em sua carreira, nas áreas de medicina preventiva/social, do trabalho e de saúde ambiental. Membro do Comitê Executivo do Capítulo Latino Americano e Caribe da International Society for Environmental Epidemiology (ISEE), também atua hoje como docente universitária e médica sanitarista e é integrante do Fórum Paulista de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos e Transgênicos.
Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk – Dra. Telma, o que é saúde ambiental?
Telma Nery – Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a saúde ambiental compreende aspectos da saúde humana, que incluem a qualidade de vida, que são determinados por fatores físicos, químicos, biológicos, sociais e psicossociais do ambiente. Também se refere à teoria e à prática de avaliar, corrigir, controlar e prevenir esses fatores do ambiente que possam afetar de forma adversa a saúde das gerações presentes e futuras.
A saúde humana e o bem-estar estão intimamente ligados à qualidade ambiental. Isto é importante e bem demonstrado nos impactos descritos, como 24% dos anos de vida perdidos por incapacidade e 23% das mortes prematuras em todo o mundo atribuíveis à exposição a riscos ambientais e ocupacionais evitáveis.
A OMS aponta ainda que a poluição do ar causou 8 milhões de mortes precoces no mundo, em 2015, e é atualmente a principal causa de morte por complicações cardiorrespiratórias, entre elas, arritmia, infarto do coração e derrame cerebral – relacionadas ao meio ambiente, e de câncer de pulmão. No estado de SP, estudo demonstrou que o total de óbitos causados pela poluição – 11.200, em 2015 – é maior que as mortes causadas por acidentes de trânsito (7.867), câncer de mama (3.620) ou aids (2.922).
Os riscos e fatores ambientais são ainda responsáveis por: 25% a 30% da carga de doenças estão relacionadas a fatores ambientais (OMS); 23% de todas as mortes; 36% das doenças em crianças 0-4 anos e 37% das mortes em crianças 0-4 anos, de acordo com a OPAS.

Blog Cidadãos do Mundo – Qual a importância da saúde ambiental para cada cidadão e para o coletivo da sociedade?
Telma Nery – É importante que todo cidadão tenha informação sobre impactos dos riscos ambientais na sua vida e que o estado, que tem como obrigação a proteção da saúde pública, adote estratégias de saúde ambiental. A atuação em saúde ambiental implica diretamente na redução da carga de doenças evitáveis e mortes precoces.

Blog Cidadãos do Mundo – Qual é o principal objetivo do Observatório da Saúde Ambiental e como o internauta pode ser beneficiado interagindo com a plataforma? Por favor, cite exemplos.
Telma Nery – Dentre os principais fatores ambientais, temos aqueles agravos gerados pelo consumo, uso e exposição a substâncias químicas, em especial, os agrotóxicos. O Brasil é o maior consumidor mundial destes produtos, desde o ano de 2008- 2009.
Neste sentido, visando conhecer o universo dos agrotóxicos no estado de São Paulo, frente ao seu uso e quais impactos à saúde humana, foi estruturado, com recursos do Ministério da Saúde, um observatório voltado para estas questões, chamado Observatório da Saúde Ambiental (com participação do Centro de Estudos Augusto Leopoldo Ayrosa Galvão e da coordenação do Centro de Vigilância Epidemiológica Professor Alexandre Vranjac da Secretaria de Estado da Saúde, através da Divisão de Doenças Ocasionadas pelo Meio Ambiente).
A plataforma contém várias informações, dados e estudos sobre agrotóxicos. É disponível para qualquer pessoa que busque informações, tanto a população de maneira geral, como também pesquisadores, mas principalmente gestores que queiram conhecer seu território e estruturar modelos de políticas públicas.
O observatório contém, por exemplo, levantamentos bibliográficos sobre câncer e agrotóxicos, malformacoes congênitas e agrotóxicos e outros impactos à saúde. São cerca de 1500 referências bibliográficas disponiveis.
Disponibiliza ainda inúmeras tabelas /planilhas com dados sobre problemas de saúde pelo Sistema de Informações de Saúde do SUS – DATASUS, separados por cada município do estado de São Paulo, também por tipos de agrotóxicos utilizados e principais culturas.
Como podem ser utilizadas? Por exemplo, se alguém quiser conhecer quais municípios utilizam o agrotóxico glifosato ( mais consumido no Brasil), consegue olhar e até comparar. Pode ainda verificar quais as principais taxas de câncer ou de intoxicações por agrotóxicos notificadas, por município, no estado de São Paulo.
Além destas informações, o observatório possibilita a criação de MAPAS, apontando as situações municipais.
Taxa de malformacao congênita

Como exemplo de uso, a Defensoria Pública do Estado de SP realizou levantamento dos dados do observatório e analisou as taxas de malformações congênitas nos municípios, identificou dados que foram tema de importante matéria na mídia. Alguns prefeitos, que desconheciam a situação dos impactos à saúde, iniciaram debates e estruturação de políticas públicas, como a de redução de pulverização ou redução da área de uso nas proximidades da região urbana.

Blog Cidadãos do Mundo – Quais os principais comprometimentos dos agrotóxicos e dos poluentes sobre a saúde humana (doenças, efeitos no SUS) e, de uma forma geral, no ecossistema? Hoje quais são os principais alertas no estado de São Paulo, em especial?
Telma Nery – Estas informações são importantes, pois a OMS e também o Instituto Nacional do Câncer (INCA) já divulgaram que alguns agrotóxicos são cancerígenos. Importante ainda lembrar que o Brasil utiliza regularmente vários agrotóxicos já banidos, por exemplo, na Comunidade Europeia, devido a seus graves impactos à saúde humana.
São muitos os reflexos no SUS. O gasto do Ministério da Saúde com tratamentos contra câncer cresceu 66% nos últimos 5 anos: R$ 2,1 bilhões em 2010 e R$ 3,5 bilhões em 2015. O
volume de doentes em tratamento no SUS: 292 mil (2010) e 393 mil(2015). Os números são reflexos do aumento de casos de câncer no País nos últimos anos e do lançamento de novas terapias e medicamentos de alto custo contra a doença.
Impactos dos fatores ambientais devem ser considerados.
Segundo estudos, no Brasil para cada US$ 1 gasto na compra de agrotóxicos, US$ 1,28 são gerados de custos externos com tratamento de saúde. (FONTE: Soares WL, Porto MFS. Uso de agrotóxicos e impactos econômicos sobre a saúde. Revista Saúde Pública. 2012: 46(2):209-17);
O estado de SP é um grande consumidor do agrotóxico, utilizando mais de 60% na cana- de-acucar e 30% do consumo é aplicado por meio de pulverização aérea e segundo Relatório operacional: 85% contra orientação do fabricante;

  • Fiscalização apontou, por GPS, presença em áreas de controle ambiental;
  • Total de área pulverizada: 11,82% do estado de São Paulo;
  • 30% dos agrotóxicos utilizados no estado são contrabandeados.

Blog Cidadãos do Mundo – Neste contexto, quais os principais cuidados, enquanto consumidor, quanto à água e aos alimentos? E ao se detectar algum problema a quem o cidadão pode recorrer?
Telma Nery – É importante lembrar que a exposição revela um consumo acumulado, ou seja, são várias as fontes do ser humano de exposição: comendo um alimento onde foi utilizado o veneno, bebendo água ou alguma substância com a presença, se expondo ambientalmente frente à pulverizacão ou especialmente aqueles que trabalham aplicando venenos. Importante destaque a estudos que mostraram presença de agrotóxicos também no leite materno.
O cidadão deve ser informado e buscar informações sobre estes impactos. Deve participar das decisões sobre uso ou nao destas substâncias. Neste momento, é mais seguro optar por alimentos orgânicos , ou sem uso de agrotóxicos. Vale lembrar que o agrotóxico não consegue ser eliminado simplesmente através de lavagem das frutas/legumes, por exemplo; e ainda a presença dos mesmos, além dos alimentos “in natura”, estão presentes em produtos alimentícios processados pela indústria: pães, farinha, pizzas etc…

Blog Cidadãos do Mundo – Quais são os principais desafios para melhorar o sistema de vigilância em saúde nesta agenda e pressionar os órgãos gestores e o mercado a mudanças de paradigmas quanto ao uso dessas substâncias?
Telma Nery – Os principais desafios para melhorar o sistema de vigilância em saúde passam pelo uso das informações disponíveis para uma ação efetiva. Já sabemos dos variados e graves impactos dos agrotóxicos na saúde humana. Precisamos que estes impactos sejam notificados, que medidas de saúde pública sejam implementadas, que imediatamente os agrotóxicos conhecidos como cancerígenos, e os agrotóxicos já banidos de outros países pelos graves efeito na saúde humana sejam proibidos de serem utilizados aqui.

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Vozes do Direito indígena refletem sobre cenário atual
14/11/2017 14:01

Por Sucena Shkrada Resk
Compreender os conceitos de bem-viver, de patrimônios imaterial e espiritual, do significado holístico da terra, do ecossistema e do território e do planeta como casa (mãe “pachamama”) e local sagrado, é o grande desafio das visões herméticas dos Estados que ainda se estabelecem na lógica de commodities e de uma cultura colonizadora por séculos. Este universo que abriga polos opostos resulta atualmente na cobrança cada vez maior de respeito ao direito internacional de ‘consulta prévia, livre e informada e autodeterminação’ de povos indígenas, tribais e tradicionais, que tem ecoado por diferentes partes do mundo, como também das efetivações dos processos de demarcações de terras indígenas, que cabem ao Estado.
Os consentimentos ou não deveriam ser pressupostos para a construção de represas, barragens, oleodutos, estradas, atividades mineradoras e extrativas que tenham impacto sobre comunidades indígenas e tribais. A realidade, entretanto, é outra.
Enquanto lideranças e advogados indígenas da Amazônia ao sul do Brasil tratavam desta pauta ontem (13/11), em evento promovido pela Coordenadoria de Pesquisa Jurídica Aplicada (CPJA) da Faculdade de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e parceiros, em São Paulo; a quilômetros de distância, no México, outros atores também se debruçavam sobre esta agenda, em encontro da Oxfam.
Essas vozes indígenas reverberam que diferentes povos estão preparados para a defesa dos seus direitos e expressam a importância de que a pauta seja incorporada como algo benéfico à toda sociedade (indígenas e não-indígenas), que resulte em forças agregadas. E esses direitos vão além do papel, são seculares.
Protocolos de consulta indígenas
Angela Kaxuyana, da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), ao ser perguntada pelo Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk, expôs ontem que uma das principais reações de povos indígenas a essa situação de desrespeito às diretrizes da Convenção OIT 169, são as criações de protocolos de consulta específicos de cada povo. “Cada um tem um modo de vida próprio, tronco linguístico e cosmovisão diferentes e essas características são colocadas nos documentos”, esclareceu.
A experiência de apropriação desta ferramenta que tem se revelado importante para a defesa no campo jurídico já tem se intensificado desde 2016, por meio de iniciativas dos povos Munduruku, de 16 povos do Território Indígena do Xingu, dos Juruna – (Yudjá), dos Krenak, entre outros.
Para a advogada indígena Lucia Fernanda Jófej Kaingáng, da coordenação do Instituto Indígena Brasileiro para Propriedade Intelectual (INBRAPI) é necessário haver ações mais contundentes no país, devido às violações de direitos contínuas. Como Angela, destaca a importância estratégica dos protocolos de consulta. A aplicação desse dispositivo é visto como significativo instrumento no campo da jurisprudência.
“Nós, enquanto movimento indígena, estamos trazendo à tona e clamando para a sociedade que veja também esta pauta, como sobrevivência dos povos…A nossa luta não é isolada. Não são somente as terras que estão sendo atacadas, mas nossas vidas. Estão nos matando gradativamente quando constroem grandes hidrelétricas, quando contaminam nossos rios, assassinam lideranças…”, diz Angela Kaxuyana.
Contexto mundial
No último mês, um grupo de lideranças e advogados indígenas tem percorrido a Europa, para denunciar os casos de violações aos direitos indígenas no país, segundo Luiz Eloy Terena, advogado indígena, que assessora juridicamente a Articulação das Organizações e Povos Indígenas do Brasil (APIB). Ele explica que está ganhando projeção uma corrente importante de reconhecimento quanto ao crime de ecocídio. “O rio, a floresta, os animais são sujeitos de direito. (Ao serem violados), se configura um crime contra a humanidade…”. Com este entendimento, se estabelece que ao se violar os direitos indígenas, todos indistintamente somos afetados.
Para Eder Terena, vereador de município em MS, o movimento indígena está se fortalecendo cada vez mais, neste campo de defesa de direitos e para quebrar um estigma preconceituoso cultural histórico de que o “indígena é incapaz”. “Tem uma leva de acadêmicos indígenas que passam pela universidade para lutar de igual para igual (aliando os conhecimentos provenientes da sabedoria indígena ancestral)”, diz.
Victoria Tauli-Corpuz, relatora especial da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre Direitos dos Povos Indígenas, apresentou um parecer abrangente, após visita ao Brasil, a respeito deste processo de violações constatados no país. Em um dos trechos, diz: “…Preocupa-me sobretudo a apresentação distorcida da mídia e de outros atores que retratam os povos indígenas como detentores de grandes extensões de terra em comparação com suas populações, quando na verdade é o setor do agronegócio que detém um percentual desproporcional do território brasileiro”.
A relatora da ONU ainda alerta no contexto mundial:
“…A expansão de indústrias extrativistas, do agronegócios e de megaprojetos de infraestrutura e desenvolvimento, afetando territórios indígenas, permanece sendo uma das grandes ameaças enfrentadas pela maior parte dos povos indígenas. Medidas de conservação continuam a colocar em risco os povos indígenas, assim como os recursos rapidamente crescentes empregados a projetos sobre mudanças climáticas feitos sem a obtenção do seu consentimento livre, prévio e informado. As consequências de tais violações sobre os povos indígenas, como tenho observado em uma ampla gama de países em todo o mundo, continuam resultando em expropriação de terras, expulsões forçadas, negação à auto-determinação, assim como déficit no acesso a recursos para sua subsistência e perda de locais de importância cultural e espiritual.
Eu estou particularmente alarmada com o número crescente de ataques diretos a lideranças indígenas e membros de comunidades que tentam defender o direito sobre suas terras. Povos indígenas que defendem os seus direitos humanos fundamentais têm sido ameaçados, presos e processados e, nos casos mais graves, têm se tornado vítimas de execuções extrajudiciais.
Apenas no ano passado, eu enviei comunicações expressando preocupação quanto a esse tipo de ataque, entre outros, ao Brasil, à Colômbia, ao Equador, à Guatemala, a Honduras, ao Paraguai, ao Peru, à Etiópia, ao Quênia, à Tanzânia, à Índia, à Indonésia, às Filipinas e aos Estados Unidos da América. Conforme previamente anunciado, eu pretendo analisar detalhadamente este tema em um próximo relatório temático, no ano que vem…”
O desrespeito aos direitos indígenas se caracteriza das mais diferentes formas, como avalia o indígena Paulo Tupiniquim, da direção da Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do NE, MG e ES. “Lideranças são criminalizadas ou morrem por defenderem seus territórios…Povos indígenas são massacrados ao terem terras tomadas pelo agronegócio ou pela (pressão) de PLs, PECs…”. Ao mesmo tempo, se dá um sucateamento de órgãos como a Fundação Nacional do Índio (FUNAI).
Patrimônios imateriais e espirituais
Paulo Tupiniquim ainda destaca a desconsideração aos valores espirituais de cada povo na implementação ou decorrentes de passivos provocados por grandes empreendimentos e citou a situação dos Krenak, na tragédia no rio Doce (MG), que atingiu até o ES, que completou dois anos.
A Universidade Federal de Minas Gerais, neste ano, mapeou as violações aos direitos humanos e impactos ao modo de vida sofrido pelos indígenas, consequência do rompimento da barragem de rejeitos da Samarco. Situação denunciada à Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Segundo ele, indenizações não substituem os ‘tesouros’ que foram destruídos, tanto no tocante a valores imateriais como de segurança alimentar.
“Quando a gente preserva as nascentes, está lutando por esse todo, pela mãe Terra…”, afirma Telma Taurepang, liderança da União das Mulheres Indígenas da Amazônia Brasileira (UMIAB), que destacou a união crescente e resistência feminina indígena. Ela critica o avanço do desmantelamento das legislações e da Constituinte. “Do que vale estar no papel, se os mesmos (que são responsáveis pelas leis), não as cumprem”, questiona.
O cacique Darã Tupi-Guarani, da Articulação dos Povos Indígenas da Região Sudeste (ARPIN SUDESTE) e da APIB, também ressalta a necessidade da incidência política indígena nestes espaços. “Precisamos ter cuidado com os tapinhas nas costas…precisamos ocupar espaços políticos…Um pé de soja (nesta lógica perversa) vale hoje mais que uma criança indígena…”, desabafa.
Panela de pressão
Esses exemplos de mobilização, no campo jurídico e de incidência política, se repetem em diferentes países e revelam bastidores de situações de violência (psicológica e física), tendo como aspecto principal a deflagração de disputa por territórios e o processo de vulnerabilização e paralisação na demarcação de terras indígenas frente a interesses de grandes proprietários da área de agronegócios ou empreendimentos, que resultam em significativos passivos socioambientais e de segurança alimentar. Paralelamente, iniciativas de alterações legislativas pressionam a desestabilização dos direitos.
A Relatoria de Direitos Humanos e Povos Indígenas da Plataforma de Direitos Humanos (Dhesca Brasil) tem exposto documentos que apontam estas questões, de forma mais sistematizada pela relatora Erika Yamada. O alerta é a configuração vigente de um racismo institucional e ambiental no país.
Nada é por acaso: a imersão se multiplica devido a ineficiência da figura do Estado (das diferentes nações), no cumprimento legal, permeado por sobreposições do mercado e de interesses políticos sobre os direitos indígenas e humanos estabelecidos em legislações e tratados nacionais e internacionais, como a Convenção OIT 169, de 1989, que no caso do Brasil, foi ratificada e se transformou em lei brasileira, somente em 2004, além da Declaração da Organização das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, de 2007.
A complexidade é tanta, que existe um documento editado pela FUNAI, em 2013, sobre a “A Convenção da OIT e o Direito de Consulta Livre, Prévia e Informada”, mas que internamente órgãos do próprio Estado, ligados à agenda, até hoje não colocam efetivamente este exercício em prática, nos planejamentos, nos licenciamentos… (http://www.consultaprevia.org/files/biblioteca/fi_name_archivo.325.pdf) .
Na Convenção OIT 169, entre suas várias proposições, está o artigo 6º:

  1. Na aplicação das disposições da presente convenção, os governos deverão:

a) consultar os povos interessados, por meio de procedimentos adequados e, em particular, de suas instituições representativas, sempre que sejam previstas medidas legislativas ou administrativas suscetíveis de afetá-los diretamente;

b) criar meios pelos quais esses povos possam participar livremente, ou pelo menos na mesma medida assegurada aos demais cidadãos, em todos os níveis decisórios de instituições eletivas ou órgãos administrativos responsáveis por políticas e programas que lhes afetem;

c) estabelecer meios adequados para o pleno desenvolvimento das instituições e iniciativas próprias desses povos e, quando necessário, disponibilizar os recursos necessários para esse fim.

  1. As consultas realizadas em conformidade com o previsto na presente Convenção deverão ser conduzidas de boa-fé e de uma maneira adequada às circunstâncias, no sentido de que um acordo ou consentimento em torno das medidas propostas possa ser alcançado.
    Já em seu artigo 12, há o seguinte texto, que também merece reflexão, se na prática existe tal procedimento:
    “Os povos interessados deverão ter proteção contra a violação de seus direitos, e poder iniciar procedimentos legais, seja pessoalmente, seja mediante os seus organismos representativos, para assegurar o respeito efetivo desses direitos. Deverão ser adotadas medidas para garantir que os membros desses povos possam compreender e se fazer compreender em procedimentos legais, facilitando para eles, se for necessário, intérpretes ou outros meios eficazes”.
    Apesar da Constituição brasileira de 1988, em seus artigos 231 e 232, trazerem à luz o campo dos direitos humanos e indígenas, como também o papel do Estado neste contexto, o que se vê é uma dicotomia permanente que envolve órgãos do Executivo e do legislativo (tramitação de cerca de 30 Projetos Emendas Constitucionais e projetos de lei, entre outros), que ficam na contramão desse processo democrático.
    (231) – “São reconhecidos índios, suas organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarca-las, proteger e fazer respeitar seus bens…”.
    (232) – “Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo…”

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As mudanças climáticas sob o olhar indígena
02/11/2017 18:15
Por Sucena Shkrada Resk
Subestimar os conhecimentos tradicionais que se perpetuam por gerações é um ato de ignorância que tem se repetido por décadas. No contexto das mudanças climáticas, essa constatação se torna mais evidente, pois a vivência dos povos indígenas e suas relações cosmológicas ancestrais são experiências que dialogam de forma concreta com a Ciência e trazem aprendizados a um campo político e econômico controverso, cujos interesses conflitam com o que a sabedoria e a razão científica expõem. Por meio das analogias e inferências, da relação entre o comportamento das estrelas e constelações ou das aves com o uso da terra e o ecossistema, os efeitos das ações antrópicas emergem nesta transcendência cadenciada.
Em tempos de Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP-23), que acontece em Bonn, na Alemanha, entre 6 e 17 de novembro, abrir a escuta, sem ranços, para esses olhares transversais pode dar mais respostas para a inovação de paradigmas de desenvolvimento em um palco político antagônico, que tem impedido reais avanços localmente e de forma global e podem emperrar acordos já firmados, desde a COP-21, em Paris. Um desenvolvimento ainda calcado em um mundo tratado como mercadoria.
O vídeo-documentário “Vozes Indígenas Num Clima em Mudança”, produzido pelo Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), traz uma escuta interessante de diferentes representantes de etnias sobre o tema. O sensível documentário “Para onde foram as Andorinhas?”, do Instituto Socioambiental e Instituto Catitu, é outro canal de comunicação audiovisual que possibilita reflexões, como também a publicação “Mudanças Climáticas e a Percepção Indígena”, da Operação Amazônia Nativa (OPAN). As falas de todos os indígenas, da Amazônia ao Xingu, entoam um grito de alerta sobre a relação conflitante do homem branco com a terra, as águas, ou seja, com todo o planeta Terra (Pachamama).
Esses povos têm diferenças culturais, que traduzem suas histórias e identidades, entretanto, não impõem fronteiras em seus discursos ao tratar do “bem-viver”, do respeito entre os mundos material e imaterial, e reverberam o propósito de bem coletivo aos parentes, aos povos tradicionais e à toda sociedade. São Baniwa, Guajajara, Idioriê, Kayabi, Krenak, Manoki, Mehinako, Munduruku, Wará, Xavante, entre outros.
Com a lente de aumento sobre todo o país, trata-se de um universo de 305 etnias e de pelo menos, 896,9 mil indígenas, de acordo com o Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2010. Hoje também existe o Comitê Indígena de Mudanças Climáticas, com representantes das cinco regiões do país. Um espaço de incidência política que merece mais reverberação.
Em outubro, ao ouvir a narrativa da liderança indígena André Baniwa, da Amazônia, em evento do Observatório do Clima (OC), realizado em São Paulo, sobre os dados mais recentes do Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG), essa gama de significativas leituras foi reforçada.
Por meio da construção de uma cartografia que tem a contribuição estratégica dos mais idosos nas aldeias, com o subsídio de calendários do uso da terra indígenas, que usam elementos de sinalização como os animais, os processos de mudanças em duas décadas reportam a um estado de apreensão. Esses dados resultam, segundo ele, na reação atual do seu povo para buscar caminhos para a sustentabilidade e bem-viver em seus territórios. Para isso, há reuniões coletivas para discutir o assunto.
“…O calendário indígena de cada povo Baniwa (de acordo com o território que vivem) é diferente. Acompanha estrelas e constelações, cada período da fase importante para a agricultura, para a pesca. Algum sinal de passarinho, andorinha antes da pesca, por exemplo, significa fartura de peixe. Hoje não existe mais este movimento, são sinais práticos…O tucunaré diminuiu de tamanho nos últimos 20 anos”.
Segundo ele, as piracemas não existem mais de forma organizada… “Agora tem muita chuva no Rio Negro e não tem peixe. Observamos, desde 2002, esse processo de cheias frequentes. Cobriram pedras antigas (lugares sagrados), que temos sobre o entendimento do mundo…”.
Nesse diálogo entre a Terra e o mundo espiritual, André sinaliza que a natureza está dando alertas. “…Atualmente há trovejadas constantes na região das aldeias, o que não ocorria. Estamos procurando entender o que isso significa. Isso nos preocupa, porque (no campo das relações sociais e políticas) nossos direitos estão sendo ameaçados e é consequência de decisões políticas, nos grandes centros do mundo…Se não houver mudança de atitude…”, deixa este alerta.
O indígena já havia levado a sua mensagem ao Espaço do Clima da Sociedade Civil, na COP-21, ao lado de outros parentes, sobre a questão climática, em evento realizado pelo Instituto Socioambiental (ISA), quando destacou: “Os xamãs do povo Baniwa dizem que esse mundo vai parar daqui a algum tempo e não haverá sinal de vida. Será um período silencioso, na nossa previsão…”.
André ainda destaca o importante trabalho de pesquisa que está sendo realizado por outros parentes, como os Tukano e de outras etnias. Uma amostra dessa interação dos povos indígenas com o processo das mudanças climáticas é o levantamento Ciclos Anuais dos Povos Indígenas do Rio Tiquié. com apoio do ISA.

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Do papel à realidade, existe um “gap” na mitigação (redução de danos) e adaptação aos eventos extremos no Brasil
18/10/2017 09:33
Por Sucena Shkrada Resk
O que dizer sobre o “Velho Chico” agonizando, e pessoas e animais tendo de dividir a pouca água que resta, entre outras centenas de cenas desoladoras por todo país? Imagens que ficam gravadas para sempre. As manchetes sobre eventos extremos e desastres naturais no Brasil, nos últimos anos, destacam a recorrência de períodos mais extensos de seca, estiagem e chuva em diferentes biomas no país, que não mais se enquadram ao que se tinha como padrão de estações nestas localidades. Muitos cientistas apontam que são situações que podem ser relacionadas aos avanços das Mudanças Climáticas, com intervenções de fenômenos, como o El Niño e La Niña, entre outros. O fato é que as ocorrências são gradativas e mais de 1,1 mil municípios se encontram hoje em situação de emergência ou de estado de calamidade pública no Brasil.
Transversalmente, a água está relacionada à maioria dos eventos, seja pela ausência ou pelo excesso, combinada ao desmatamento, queimadas, e uso e ocupação do solo desordenados, falta de saneamento ambiental e consumo desmedido de água na irrigação. Relatórios e mais relatórios de órgãos que controlam ou pesquisam estes aspectos se repetem, mas os efeitos práticos de ações na ponta não ocorrem. Sem dúvida, o Nordeste apresenta os efeitos mais perversos, com seis anos de seca/estiagem consecutivas.
As consequências são a savanização gradativa a olhos nus, como na Amazônia já prevista até o final do século, em estudos no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), destacados por Carlos Nobre, associados ao aumento de incêndios, queimadas, enxurradas, deslizamentos mais frequentes e um quadro que atinge, em especial, as populações de baixa renda, mais vulnerabilizadas.
Este conjunto de fatos de origem antrópica e não-antrópica revela a ‘incapacidade’ de municípios para dar respostas mais rápidas de mitigação (redução de danos) e adaptação. Há um “gap” representativo no que tange a investimentos em infraestrutura de qualidade (com vida útil de longo prazo), ao mesmo tempo, que muitos municípios ‘crescem’ de forma descontrolada. Ano após ano, as manchetes se repetem cada vez mais desoladoras, em que famílias resilientes ‘resistem’. Mas até quando?
Até o último dia 17, a Defesa Civil Nacional divulgou que 1.134 municípios são reconhecidos em situação de emergência ou de estado de calamidade pública no país, predominantemente no Nordeste e no estado de Minas Gerais, O maior número de ocorrências na BA (231), com situação de estiagem, seca e dois casos de erosão costeira/marinha, em Mucuri e Prado, e em MG (189). Populações dependem da água que vem em carros-pipa e quem vive nos rincões sofre muito mais para ter este acesso.Na região sul, o RS é o estado com maior número de casos (168), com enxurradas, inundações, tempestades e alagamentos.
Nesse contexto de perdas e danos, que infere estado de subnutrição, problemas de saúde agravados, aumento de internações no Sistema Único de Saúde (SUS) e sequelas, sequer dimensionadas, de efeitos que afetam diferentes gerações, as estatísticas revelam uma realidade cruel, com mortes, desalojados, desabrigados, destruição de fauna e flora, de bens públicos e de acessos logísticos. Nas áreas rurais, principalmente pequenos agricultores veem completamente aniquiladas as agriculturas de subsistência ou que geram renda para as suas famílias.
O Centro de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (Cemaden), que integra o Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, desde 2011, monitora hoje 957 municípios em todo Brasil, dentro do escopo do Plano Nacional de Gestão de Riscos e Respostas a Desastres. Uma das imagens mais gritantes que foram apresentadas recentemente na mídia, foi dos cerca de 3 milhões de peixes mortos no leito que secou da Lagoa Itaparica, a maior marginal do “Velho Chico”, entre Xique-Xique e Gentio do Ouro, na BA.
Um boletim sobre a situação da seca no semiárido e impactos no mês de setembro, que mapeia este cenário, foi divulgado neste mês, por sua equipe técnica. A seca mantém-se principalmente nas porções oeste e norte da Região Nordeste. Em alguns pontos isolados nos Estados do Piauí, Ceará, Pernambuco e Maranhão, já perdura além de vinte um meses, e 11 municípios se encontram na categoria de seca severa.
Em áreas rurais, cerca de 360 municípios tiveram as atividades agrícolas e/ou pastagens afetadas em aproximadamente 500 mil hectares, em especial, na BA, que atingiu também 31.459 estabelecimentos de agricultura familiar.
O Sistema de Alertas e Visualização de Áreas de Risco – SALVAR, do Cemaden, é uma plataforma computacional desenvolvida para monitorar dados ambientais, que ainda não dá conta de um território tão amplo, quanto o Brasil . E já existem previsões climáticas trimestrais, que são importantes para orientar os gestores públicos, que por muitas vezes, não têm equipes ou capacidade técnica e ‘vontade política’ para utilizar da melhor forma estes dados.
Para os próximos meses, algumas das sinalizações são de que os açudes na região semiárida do Nordeste permanecerão críticos, com volumes armazenados nos reservatórios equivalentes dos estados de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará respectivamente iguais a 4,8%, 8,7%, 15,4% e 8,5%. Já na Região Centro-Oeste, na bacia do rio Tocantins-Araguaia, há uma situação que se agrava principalmente no reservatório de Serra da Mesa, atualmente com 8,16% de seu volume útil. Esses são alguns dos exemplos de informações do que se pode fazer com meses e até anos de antecedência, para evitar que os efeitos sejam cada vez mais catastróficos na vida de milhares de brasileiros dessas regiões.
Ainda há um caminho muito longo para a implementação do Programa 2040 – Gestão de Riscos e de Desastres, pela Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil, que está previsto no Plano Plurianual (2016 – 2019) e uma dedicação, de fato, dos municípios e estados para as prioridades de infraestrutura, que depende, em parte, da escolha de políticos nas urnas e do exercício cidadão e participativo da população no dia a dia e nas instâncias participativas, como conselhos, comitês, movimentos e fóruns.

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Ivaporunduva ecoa vozes pelos direitos quilombolas no Brasil
16/10/2017 08:42
O Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk coletou dois depoimentos, há algumas semanas, em Eldorado, SP, de lideranças do Quilombo Ivaporunduva, no Vale do Ribeira, em defesa dos direitos adquiridos pelas comunidades em todo o Brasil, com o decreto 4887/2003, que regulamenta a titulação de terras remanescentes quilombolas. A Ação Direta de Inconstitucionalidade ADI nº 3239/2004, de autoria do Partido Democratas (DEM), antigo Partido da Frente Liberal, está novamente na pauta de julgamento do Supremo Tribunal Federal, no dia 18 de outubro.

Atualização O ministro relator Dias Toffoli não compareceu no dia 18. Encaminhou informação que é por motivo de saúde, para cirurgia de emergência, devido descolamento de retina. Com isso, votação desta pauta foi suspensa novamente.

Ouça Benedito Alves da Silva, mais conhecido por “Ditão: entrevistaBeneditodaSilva_DitaoIvaporunduva_BlogCidadãosdoMundoSucena2017.m4a (1,9 MB)

E de seu filho, o professor de História Elson Alves da Silva, atual presidente da Associação do Quilombo de Ivaporunduva: entrevistaElsonAlvesdaSilva_Ivaporunduva_BlogCidadãosdoMundoSucena2017.m4a (8,8 MB)
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25/01/2010 – Especial: Fórum Social Mundial 2010 – Caminhada celebra a diversidade
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20/02/2009 . Mais FSM 2009 – As vozes quilombola paraense e indígena dos Andes
12/08/2007 – Ainda existe um bom jornalismo

*Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk

Arpilleras: a defesa dos direitos tecida com a sensibilidade da arte
11/10/2017 11:35
Por Sucena Shkrada Resk, no Rio de Janeiro
Maria Alacídia, 52 anos, de Altamira, Pará, e Claides Helga Kohwald, 76 anos, do Rio Grande do Sul e que hoje mora no Paraná, vivem a milhares de quilômetros de distância, mas têm suas vidas ligadas por um bordado e por uma “linha histórica” em comum. A primeira teve sua família e comunidade atingidas com a construção da Usina Hidrelétrica (UHE) de Belo Monte, no rio Xingu, e a segunda, pela UHE ITÁ, no rio Uruguai, entre SC e RS. A leitura de ambas sobre como foram afetadas se mesclam em um bordado “arpillera”. Militantes do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) encontraram nesta linguagem em defesa dos direitos humanos uma quantidade de significados nas entrelinhas, por seu grau de sensibilidade.

“Fazer parte desta proposta é muito emocionante. É a realização de um sonho. A comunidade em que eu vivia, no RS, deixou de existir”, disse Claides, ao Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk, no último dia 4 de outubro, durante Encontro Nacional do MAB, no Rio de Janeiro.

“Neste bordado contamos nossas dores. A vida de minha família se transformou e perdemos nosso convívio social (decorrente do processo migratório”, desabafou Maria.
Com esta carga emocional latente, são construídas as mensagens das “arpilleras” (nome em espanhol, do tecido juta ou de cânhamo), que pela arte de uma técnica tridimensional têxtil do bordado confeccionada com agulhas, panos rústicos, retalhos de tecido, linhas e outros acessórios conta histórias, traduz reivindicações e denúncias, na maioria das vezes, mensagens doloridas, mas que justamente por este formato delicado e forte ao mesmo tempo cativam diferentes gerações. Durante o evento, vários trabalhos foram expostos, inclusive, de outros países da América do Sul, como Colômbia.

As “arpilleras” tratam das pautas mais diversas, que tem como eixo central, a defesa dos direitos à dignidade humana e pela paz, que inclui a importância do empoderamento de populações vulnerabilizadas, no contexto do direito à moradia, saúde, trabalho, do combate à violência em suas diferentes nuances, incluindo de gênero, e tantas outras agendas prioritárias de cidadania.
O que torna estes trabalhos instigantes semioticamente é que são feitos por várias mãos e com uma carga de inferências grande de “universos” de biografias distintas, que se encontram em suas semelhanças nas causas. Há um diálogo que interage, por diversas vezes, na composição de cada peça de bordado. Homenagens a ícones de mobilizações também integram estas propostas, como a pescadora Nicinha e Berta Cáceres, coordenadora do Conselho Cívico de Organizações Populares e Indígenas de Honduras (Copinh), ambas assassinadas no ano passado.

Origem chilena
Quem pensa que é uma prática recente, do século XXI, se engana. Teve sua origem com um grupo de bordadeiras de Isla Nesgra, no litoral chileno, nos anos 1960, se acentuou na década seguinte, no período da Ditadura Pinochet (1973-1990), e se difundiu transfronteiriçamente, incluindo o Brasil, com manifestações de integrantes do Movimento de Atingidos por Barragens (MAB), entre outros, após a realização de oficinas para o aprendizado da técnica. Ao mesmo tempo, é um exemplo de ação cooperada e da possibilidade da viabilização de economia justa e solidária, que gera renda para muitas famílias.
A folclorista Violeta Parra (1917-1967) foi uma divulgadora importante das “arpilleras”. A partir dos anos 1960, difundiu esta linguagem em espaços importantes da arte mundial. A artista, que deixou o legado da composição Gracias a la Vida, teve uma morte precoce, aos 49 anos, ao se suicidar. A sua contribuição cultural e cidadã, no entanto, se perpetua, no museu que leva o seu nome, em Santiago do Chile, no qual há uma exposição permanente de arpilleras, com 23 obras.

A experiência de militantes do MAB, em que as histórias de Maria e Claídes fazem parte, se transformou no documentário “Arpilleras: atingidas por barragens, bordando a resistência”. A iniciativa foi financiada com recursos captados por meio da plataforma Catarse, com 308 apoiadores, e já teve sua pré-estreia em Belém e no Rio de Janeiro, e chega a São Paulo, no dia 19 de outubro, no Cine Caixa Belas Artes. Confira o trailer em: https://www.youtube.com/watch?v=N-Q3hRtcwiM . Um laboratório de cidadania!

Veja também no Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk:

09/10/2017 – Justiça socioambiental: centenas de vozes ecoam homenagem póstuma à pescadora Nicinha, no Rio de Janeiro
Projeto Vozes dos Biomas – jornalista Sucena Shkrada Resk – entrevistada: pescadora Creuza Campêlo da Silva
09/07/2017 – O discurso da invisibilidade no contexto da injustiça socioambiental e no campo
2016 – Mortes de ativistas não podem se perder nas estatísticas
2014 – Justiça socioambiental: um grande gargalo no Brasil

Justiça socioambiental: centenas de vozes ecoam homenagem póstuma à pescadora Nicinha, no Rio de Janeiro
09/10/2017 17:53
Por Sucena Shkrada Resk, no Rio de Janeiro
A pescadora Nilce de Souza Magalhães, mais conhecida por Nicinha, liderança feminina do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), no estado de Rondônia, defendia os direitos das populações afetadas pelo Complexo Hidrelétrico, no rio Madeira e seus afluentes, em especial pela implementação da Usina Hidrelétricas de Jirau. No dia 7 de janeiro de 2016, aos 50 anos, ela teve sua voz calada ao ser assassinada, entretanto, sua mensagem continua a ecoar fortemente até hoje em mobilizações voltadas aos direitos humanos de populações vulnerabilizadas por grandes empreendimentos.

No dia 4 de outubro deste ano, foi homenageada por centenas de integrantes do movimento, em celebração mística coordenada por grupo feminino da militância, em encontro nacional realizado no Rio de Janeiro, com a participação de mais de 3,5 mil pessoas. Foi um momento de forte emoção entre os presentes, também dedicado à homenagem à hondurenha Berta Cáceres, coordenadora do Conselho Cívico de Organizações Populares e Indígenas de Honduras (Copinh), também assassinada no ano passado.

Genilce de Souza Andrade, filha caçula de Nicinha, em entrevista especial ao Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk, falou sobre o legado deixado pela pescadora, que coincidentemente, tem sua origem em uma família de seringueiros, em Xapuri, no Acre, como o ativista ambiental Chico Mendes, assassinado em uma emboscada, em 1988. Ouça o depoimento: GenilcedeSousaAndrade0410Sucena.m4a (3033522) .

Em março deste ano, Edione Pessoa da Silva, assassino confesso da pescadora, foi condenado pela 1ª Vara do Tribunal do Júri, em Porto Velho, a 15 anos e seis meses em regime fechado pelos crimes de homicídio qualificado e ocultação de cadáver (o corpo de Nicinha só foi encontrado seis meses depois no lago da UHE Jirau, em Nova Mutum-Paraná, em Porto Velho, com marca de tiro e preso a uma pedra). A família só pôde enterrá-la praticamente um ano depois, por causa de lentidão técnica para reconhecimento do corpo. Para a polícia, o caso não tem relação à militância socioambiental da pescadora. Segundo o MAB, entretanto, o inquérito deixou lacunas quanto a possíveis mandantes do crime e motivações.

As reivindicações da ativista, da região de Velha Mutum, eram voltadas ao reassentamento digno das famílias afetadas pela barragem, como também de caráter ambiental. Nicinha criticava a ineficiência do Programa de Apoio à Atividade Pesqueira, por parte do consórcio responsável pela UHE, Energia Sustentável do Brasil (ESBR).

A pescadora denunciava o maciço de florestas que estava sendo destruído com o reservatório, onde haviam espécies como castanheiras e açaís, além do enterramento das árvores destruídas no lago, gerando mais emissão de Gases de Efeito Estufa (GEEs). Em suas falas, destacava sua revolta com o processo de deterioração do ecossistema do rio Madeira e consequentemente dos impactos à população ribeirinha, que dependia da atividade pesqueira. “A gente não sabe mais o que é rio, o que é lago…”, dizia.

Além de Nicinha, outros assassinatos decorrentes de conflitos no campo ocorreram em Rondônia, no ano passado, de acordo com o relatório da Comissão Pastoral da Terra 2017, totalizando 21 casos. Com isso, o estado figura em primeiro lugar no ranking da violência no campo. Uma estatística cruel e que revela a necessidade de políticas públicas e fiscalização mais efetivas com o objetivo de prevenção de mais ocorrências.
Veja também no Blog Cidadãos do Mundo:
08/2017 – Projetos Vozes dos Biomas – jornalista Sucena Shkrada Resk (entrevistada Creuza Campelo da Silva)
09/07/2017 – O discurso da invisibilidade no contexto da injustiça socioambiental e no campo
2016 – Mortes de ativistas não podem se perder nas estatísticas
2014 – Justiça socioambiental: um grande gargalo no Brasil

  • Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk

Gameleira traz um exemplo propositivo de afirmação identitária quilombola
25/09/2017 12:22
PÍLULAS SOCIOAMBIENTAIS

Por Sucena Shkrada Resk
O Museu Gídio Veio, da Comunidade de Remanescentes Quilombolas de Gameleira, em São Tomé, no Rio Grande do Norte, é uma prova de que o senso de pertencimento étnico ao território pode ser ‘perpetuado’ por meio de ações proativas, que tragam o resgate histórico escrito e oral. Conheci um pouco desta iniciativa em pleno sertão nordestino, árdua mas exitosa, por meio da narrativa da pedagoga quilombola Maria Lúcia Santos do Nascimento, entrevistada no programa ‘Grandes Temas’, da TV Universitária de RN. Ela é a tataraneta do precursor do quilombo.

Reconhecida pela Fundação Palmares, em 2009, Gameleira reflete o sentido da importância da resiliência nesta região extremamente seca. Alguns poetas, como Marciano Medeiros, já descreveram a comunidade em pequenos cordéis.
https://www.youtube.com/watch?v=T6FqiRU7yok
*Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk

Leia mais: http://cidadaosdomundo.webnode.com/news/gameleira-traz-um-exemplo-propositivo-de-afirmacao-identitaria-quilombola/

Ser quilombola: um diálogo com a memória ancestral
21/08/2017 16:06
Por Sucena Shkrada Resk, em Eldorado (SP) – 20/08/2017
“Eu tenho uma memória ancestral que diz quem eu sou”, destaca o quilombola Ronaldo dos Santos, coordenador executivo da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ). Essa afirmação nunca foi tão necessária como agora, em que direitos conquistados da autodeterminação sofrem pressão para serem desconsiderados (veja mais em Mobilização nacional defende comunidades remanescentes quilombolas contra retrocessos em direitos estabelecidos ). O fantasma de se estabelecer um marco temporal até 1988 para reconhecimento dos quilombos faz parte deste pacote.

Pela quarta vez, a Ação Direta de Inconstitucionalidade ADI nº 3239/2004 realizada pelo Partido Democratas (DEM), antigo Partido da Frente Liberal, no Supremo Tribunal Federal (STF), está sendo retomada. O objetivo é anular o decreto 4887/2003, que regulamenta a titulação de terras remanescentes quilombolas. O julgamento foi adiado no último dia 16, porque o ministro Dias Toffoli (que havia pedido vistas do caso) saiu de licença médica programada até hoje. A votação da pauta está sendo remarcada.

“Vivemos um momento de incertezas. Se a sociedade não se movimentar para preservar os direitos conquistados na Constituição de 88, será esfacelada por meio de medidas provisórias e Projetos de Emendas Constitucionais (PECs). No Congresso, há 20 pedidos de emendas parlamentares que tratam do direito quilombola, e só quatro na direção de ampliação”, alerta Denildo Rodrigues de Moraes, coordenador nacional da Conaq. O quilombola reforça que a sociedade não pode ficar amortecida com os diferentes tipos de medidas que não só atingem quilombolas, indígenas e povos tradicionais, como toda a classe trabalhadora do país.

Ronaldo do Santos cita a importância do artigo 68 da Constituição, subsídio de fundo, neste embate jurídico – “Art. 68. Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado lhes emitir os títulos respectivos” – que é um Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT).
“O decreto 4887/2003 está em contestação há 13 anos… Só pode ser anulado, se for julgado inconstitucional. Isso seria um problema sem precedentes para nós, porque incide sobre processo de regularização fundiária”, afirma o coordenador executivo da Conaq.
Ele ainda faz uma análise sobre o desafio do contexto nacional da assimilação da sociedade sobre a existência dos quilombos. “O brasileiro, de uma maneira geral, em um olhar macro, não sabe que o quilombo existe. Quando falo para uma pessoa que sou quilombola, primeiro ela não acredita. Mesmo acreditando, não assimila. Depois de 15 minutos, pergunta se moro mesmo em um quilombo. Não admite que moro lá, é algo surreal para ela…”, relata.

Santos observa que o povo quilombola ainda não existe para a consciência coletiva do brasileiro, de uma maneira geral. “Nossa luta é um milhão de vezes maior, como se remássemos contra uma correnteza muito forte. Mas está bem melhor, que há 13 anos, com uma adesão (gradativa) do cidadão comum, da classe artística e da academia”, analisa.

“Temos medo da possibilidade da aprovação do marco temporal, porque é um retrocesso nos direitos conquistados. Muitas comunidades retornaram aos seus locais de origem, porque haviam sido expulsas ou abandonadas em tempos passados”, relata Rodrigo Marinho Rodrigues da Silva, quilombola de Ivaporunduva, da Articulação e Assessoria das Comunidades Negras do Vale do Ribeira (EAACONE), onde há atualmente 48 comunidades, nos estados de São Paulo e Paraná.

Segundo Silva, ao mesmo tempo, existe a paralisação das políticas para regularização fundiária no país. “Mesmo comunidades certificadas não recebem políticas específicas. Só depois de reconhecidas, conseguem acessar alguns programas estaduais, como de assistência técnica rural”, diz. Essa é a realidade na maior parte do Brasil e o Vale do Ribeira não foge a esta regra, tendo somente o Quilombo de Ivaporunduva, o registro. “Somente há mais três outras comunidades tituladas – São Pedro, Galvão e Maria Rosa, que ainda aguardam a providência dos registros, que dependem do Instituto Nacional da Reforma Agrária (INCRA)”.

A luta para regularização fundiária é uma constante, reforça Elson Alves da Silva, coordenador geral da Associação Quilombo Ivaporunduva e da Eaacone.
“Existe o artigo 68 e é o dever do Estado garantir esta posse. Somos mais de 5000 comunidades, passaram-se anos depois do decreto que veio para regulamentar este artigo, mas os avanços são lentos. Temos 87 registradas em cartório. É pouquíssimo. As políticas não têm sido executadas a contento. Ivaporunduva só conseguiu o registro em junho de 2010, porque entramos com ação por meio do Ministério Público, para o Incra fazer o levantamento do território. Foram 16 anos de luta”, conta.
Elson, que é educador e Mestre em Educação, destaca – “No nosso território, desenvolvemos nossa educação também não formal, que forma o jovem para a vida. Desenvolvemos a nossa roça tradicional de coivara, de subsistência. Mas ainda enfrentamos problemática com o Código Florestal. Nós temos relação forte com a terra, que é vida e faz parte do ser humano”, diz. Ele menciona que entre as agendas de luta quilombola também está a constituição de um currículo específico. “Desde 2012, aqui no estado de São Paulo, nos mobilizamos para isso”.

Na sua avaliação, o Estado brasileiro tem uma dívida histórica com os quilombolas, que não deve ser menosprezada. “…Somos todos seres humanos, houve muito derramamento de sangue historicamente. Estamos entre os principais atores na construção desse país. A bancada ruralista quer retirar este direito. É um desconhecimento político destes deputados, que não têm fundamentação teórica e prática. Vivemos um processo de reexistência nesses anos no Brasil. Não estamos pedindo favor, mas que os nossos direitos sejam respeitados”. E a violência continua nos dias de hoje. Recentemente foram mortos oito quilombolas na Bahia.

Os depoimentos descritos e entrevistas concedidas ao Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk ocorreram durante momento de diálogo da VIII Feira de Sementes e Mudas Tradicionais, em Eldorado, com participação de quilombolas e outras comunidades, sob organização do Instituto Socioambiental (ISA).

Mobilização nacional defende comunidades remanescentes quilombolas contra retrocessos em direitos estabelecidos
01/08/2017 11:40
Por Sucena Shkrada Resk

Nos últimos anos, está sendo construído um cenário de retrocessos no campo dos direitos humanos no Brasil, que ferem a Constituição de 1988. Atualmente, uma causa que ganha visibilidade é a das comunidades remanescentes quilombolas. Isso acontece, porque o julgamento iniciado em 2012, sobre a Ação Direta de Inconstitucionalidade ADI nº 3239/2004 realizada pelo Partido Democratas (DEM), antigo Partido da Frente Liberal, no Supremo Tribunal Federal (STF), está sendo retomado no início da segunda quinzena de agosto. O objeto da ação é o decreto 4887/2003, que regulamenta a titulação de terras remanescentes quilombolas, e corre o perigo de ser anulado.

Segundo levantamento da Fundação Palmares, são mais de 3.600 comunidades remanescentes certificadas até julho deste ano pela organização e cerca de 260 estão em análise técnica para certificação. Mas o número de comunidades pode ser bem maior, ultrapassando seis mil, segundo representações do segmento quilombola.
Mesmo com o decreto em vigor, os processos de titulações ainda são lentos no país. Somente 258 comunidades têm propriedade definitiva em 168 territórios quilombolas titulados pelo Instituto Nacional Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). De acordo com levantamento realizado pela Comissão Pró-Índio, nos últimos sete anos, o orçamento do instituto sofreu uma queda de 94%, o que praticamente inviabiliza os processos, que estão atualizados até mês de setembro do ano passado.

Com relação à ADI nº 3239/2004, uma mobilização nacional foi iniciada por representantes das comunidades remanescentes quilombolas com apoio de diferentes segmentos da sociedade civil com o intuito de que a decisão da Justiça seja contrária à ação. É a campanha O Brasil é Quilombola! Nenhum Quilombo a Menos! , na qual também foi elaborada uma petição, que está aberta a adesões e vídeos de mobilização, com o apoio do Instituto Socioambiental (ISA) e de Uma Gota no Oceano.

A mobilização rebate os argumentos expostos pelo DEM, entre os principais, de que é inconstitucional no decreto reconhecer às pessoas, que por auto-atribuição, se declararem como remanescentes de comunidades quilombolas, o direito à propriedade de terras, que no período imperial, formavam os quilombos.

A legislação diz o seguinte – “…remanescentes das comunidades dos quilombos, para os fins deste Decreto, os grupos étnico-raciais, segundo critérios de auto-atribuição, com trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida…” . Este conceito se ampara também na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário, que assegura aos grupos e comunidades tradicionais o direito de se autodefinirem.

Em 2013, Andreza do Socorro Pantoja de Oliveira Smith, advogada e Mestre em Direitos Humanos, fez uma análise sobre a relatoria desse processo, que estava sob a condução do ministro Antonio Cesar Peluso (hoje aposentado) e deu parecer favorável à ADI, condicionando os efeitos da decisão para “declarar bons, firmes e válidos” os títulos de tais áreas, emitidos até agora, com base no Decreto 4.887/2003.
“Avaliar que a propriedade não pode ser coletiva para os remanescentes de quilombos, é impedir que eles possam construir formas de desenvolvimento próprias, de acordo com suas práticas sociais e culturais, inclusive pelo valor diferenciado dado ao território ocupado”, disse a especialista a respeito do voto favorável. Em 2015, a ministra Rosa Weber abriu a divergência e votou pela improcedência da ação, entendendo pela constitucionalidade do decreto presidencial. Segundo ela, o dispositivo é autoaplicável e não necessita de lei que o regulamente, portanto não houve invasão da esfera de competência do Poder Legislativo pela Presidência da República. Saiba mais.

O Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk entrevistou Givânia Maria da Silva, da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), que apresenta a avaliação da organização sobre o processo em andamento.

  • Blog Cidadãos do Mundo – Qual é o posicionamento da Conaq com relação ao decreto 4.887/2003 e a retomada do julgamento da ADI, em agosto, pelo STF?
  • Givânia Maria da Silva – O decreto 4.887/2003 é um instrumento que veio para regulamentar o artigo 68 do ato das disposições constitucionais transitórias da Constituição de 88. A Conaq foi parte do grupo que construiu esse texto, no ano de 2003, e debateu por meses, qual seria o melhor instrumento. Substituiu o decreto 3.912, que apresentava vários problemas temporais e conceituais.

O conteúdo do decreto 4.887/2003 tem tudo a ver com o que pensam os movimentos sociais e o Conaq, sobretudo no que tange a quem cabe a responsabilidade de quem titular e aos conceitos de terra e de comunidade quilombola. O Partido DEM está promovendo um processo de genocídio da comunidade negra, com esta ação. Estamos trabalhando fortemente para que esse julgamento não aconteça. Temos receio, porque nem todos estão comprometidos com os direitos dos trabalhadores, e Direitos Humanos.

  • Blog Cidadãos do Mundo – A Comissão Pastoral da Terra (CPT), em seu levantamento sobre violência no campo, tem apresentado o aumento de casos com vítimas quilombolas, em diferentes localidades do país. O que tem a dizer a respeito desta situação? E quais são as principais ações da Conaq hoje?
  • Givânia Maria da Silva – Nos últimos tempos, temos dedicado a energia para a questão da terra. Não estamos falando só da terra, mas como a compreendemos que seja possível de morar, de forma ambientalmente correta e que permita aos nossos filhos produzirem com dignidade na vida e para as futuras gerações. Tem havido o aumento da violência, da expropriação, do conflito principalmente com as grandes obras e mineradoras, e com o agronegócio. Em pouco mais de um mês, quatro companheiros quilombolas foram mortos. Observamos ao longo do tempo, a impunidade na solução desses casos. Temos feito uma mobilização intensa no país, sem deixar de dialogar com os órgãos, exceto neste governo, com o qual não está tendo a mínima possibilidade, pois está aprofundando cada vez mais a crise e a corrupção no país.

Formulamos uma denúncia internacional. Caso o STF vote a favor da ADI, chancelará uma lei equivalente à da escravidão. A Conaq entende que o julgamento é intempestivo. Tantos temas parados no Supremo e justamente neste momento que o governo brasileiro vem arrastado e derrotado na democracia, se coloca mais um ataque aos trabalhadores, que podem sofrer uma derrota.

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09/07/2017 – O discurso da invisibilidade no contexto da justiça socioambiental e no campo
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2014 – Justiça socioambiental: um grande gargalo no Brasil
23/11/2013 – Quilombolas: raiz, identidade cultural e ancestralidade
20/02/2009 Mais FSM 2009 – As vozes quilombola paraense e indígena dos Andes
Atualização – 07/08/2017 – 14h30*

Repercussões:

O discurso da invisibilidade no contexto da injustiça socioambiental e no campo
09/07/2017 18:10
Por Sucena Shkrada Resk
Vivemos tempos de invisibilização acentuada de povos e comunidades tradicionais e indígenas promovida pelos modus operandi das políticas de infraestrutura, que ferem os direitos instituídos legalmente, no âmbito nacional e internacional. Algumas das agendas com maior número de casos atualmente são as dos processos relacionados a empreendimentos de infraestrutura e a conflitos associados à posse de terra. Neste recorte, na Amazônia é revelado um quadro de vulnerabilidade ascendente, que resulta em violência moral e física às vítimas. Os números de emboscadas e assassinatos têm aumentado exponencialmente, revelando o crescente desordenamento no campo da justiça socioambiental e agrária brasileira.

Um levantamento realizado pelo Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos aponta que o poder público não está coibindo este quadro. No último dia 4, no PA, foi apresentado o estudo “Vidas em Lutas: criminalização e violência contra defensoras e defensores de direitos humanos no Brasil”. Em 2016, foram 66 ativistas mortos. Neste total, 40 mortes foram registradas em conflitos agrários, 11 em disputas por territórios indígenas e três por áreas quilombolas, entre outros. Rondônia, Maranhão e Pará apresentam os maiores números de casos.

No Caderno Conflitos no Campo – Brasil 2016, a Comissão da Pastoral da Terra (CPT) traz um mapeamento ainda mais preocupante. De acordo com os registros, foram 61 assassinatos, 1.295 conflitos por terra, 172 pela água e mais uma vez a Amazônia está em destaque, com 57% das ocorrências de conflito, e 54% das famílias envolvidas em conflitos por terra.

Mais uma constatação desse cenário se revela com as informações da organização internacional não governamental Global Witness, no levantamento “Em terreno perigoso”, no qual há o seguinte dado: dos 185 ambientalistas assassinados no mundo, o Brasil lidera o ranking, com 50 mortes (em 2015), 59% a mais do que 2014.

Listar nomes e famílias que perderam seus entes ao longo dos anos não seria suficiente para atenuar o sofrimento dessas pessoas. Em grande parte desses casos, o mais complexo é saber que os culpados sequer foram ou estão sendo punidos. Existe uma política desconcertante de incentivar a invisibilidade dessas pessoas.

Recentemente alguns dos casos que vieram à tona na mídia, foram das chacinas ocorridas na Gleba Taquaruçu do Norte, na região de Colniza (MT) e de Pau – D`Arco (PA), que ingressarão nesta estatística perversa. A região de Xapuri, onde foi morto Chico Mendes, também volta a protagonizar conflitos. No último dia 4, Francisco de Assis Monteiro, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, fez a denúncia na Assembleia Legislativa do Acre, acompanhado por dezenas de trabalhadores.

A Organização das Nações Unidas (ONU) recentemente expôs que o Brasil é onde mais se mata ativistas ambientais no mundo. A Comissão Inter-Americana de Direitos Humanos denuncia ataques contra direitos dos povos indígenas e contra a proteção ambiental no Brasil.

O que se percebe com essa desenfreada escala de violência é que a existência Constitucional e de leis específicas de direitos, no dia a dia, são relegadas a uma esfera burocrática desumanizadora. O que é preciso mais se fazer para tirar esta agenda do limbo da política pública e legislativa e dar o devido valor que merece?

Veja também, no Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk :
2016 – Mortes de ativistas não podem se perder nas estatísticas
2014 – Justiça socioambiental: um grande gargalo no Brasil
Leia mais: http://cidadaosdomundo.webnode.com/news/o-discurso-da-invisibilidade-no-contexto-da-injustica-socioambiental-e-no-campo/

Repercussão:

O ônus socioambiental da contemporaneidade “Flex”
22/01/2017 18:21
Por Sucena Shkrada Resk

Quando dizemos que um indivíduo ou uma nação têm “palavra”, o sentido implícito nesta frase implica retidão, ética e relação de confiança. Mas nos deparamos hoje na contemporaneidade com uma fragilidade que reflete um mundo em que leis, direitos instituídos e promessas se encaminham cada vez mais à flexibilização. Por artifícios que seguem a bula dos procedimentos legais ou por meios ilegais, as artimanhas se consolidam de forma orquestrada ao sabor dos interesses dos atores envolvidos, tendo como mote a relação com o estabelecimento do poder em detrimento do bem comum. É, estamos falando de um mundo “flex” que gera temor pela inconstância. Essa característica cada vez mais acentuada se deflagra na nossa política interna e internacional. Tempos difíceis que nos deixa uma carga considerável de ônus para as atuais e próximas gerações.
Hoje algumas das áreas que estão mais vulneráveis a essas estratégias são as do direito indígena e de povos tradicionais, e da conservação ambiental, destituindo já os fracos órgãos que atuam nos papeis de avaliação e fiscalização, reduzindo o espaço de escuta dessas populações e da sociedade e abrindo espaço para que os setores que provocam passivos tenham maior poder. Projetos de lei em tramitação no Congresso revelam esse rumo de retrocesso aos direitos estabelecidos constitucionalmente.
Na agenda, estão propostas que tratam da flexibilização do licenciamento ambiental, das outorgas de mineração, de demarcação de terras indígenas, de caça de animal silvestre, de introdução de pastagem em reserva legal, de autorização de vaquejadas e rodeios. Como também de ações menos restritivas, como não aprovar penas mais altas a quem promove queimadas. Por outro lado, também enfrentamos outra questão importante: as políticas que “não pegam”. Vide a situação da Política Nacional de Resíduos Sólidos.

Na esfera internacional, as declarações e medidas tomadas pelo atual presidente dos EUA, Donald Trump, enfatizam a anulação de iniciativas na área socioambiental tomadas por Barack Obama, no contexto das conferências do clima, entre outros espaços de negociação. Ao mesmo tempo já nomeou para a pasta, um cético quanto às mudanças climáticas e aliado da indústria petroleira, que gera Gases de Efeito Estufa (GEEs). Com tudo isso, observamos que o que hoje é uma norma ou linha política, amanhã pode deixar de ser, de acordo com a visão de mundo dos detentores do poder e também do mercado global. A chamada moeda de “valoração” dos bens intangíveis desaparece nesta escala, em que valores monetários se sobressaem. Aí volta à tona a reflexão entre ser e ter. Uma boa pauta para estar no centro dos debates nesses tempos “flex”.
*Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk
Repercussão:

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